Retomando nossa
reflexão, na semana passada vimos que o texto hebraico do Antigo Testamento foi
devidamente preservado pelos massoretas, suplantando os antigos escribas
judeus, pois eles acrescentaram a vocalização (sistema de pontos e traços) e os
sinais gráficos que auxiliam a pronúncia do texto consonantal recebido dos soferim,
com base naMassorá (tradição) que haviam recebido. Duas escolas ou
centros de referência massorética, cada uma bastante independente uma da outra,
tomaram a frente do trabalho: a babilônica (Escola oriental) e a palestinense
(Escola ocidental).
Gilson Souto Maior JuniorPastor Sênior da Igreja Batista do Estoril Bauru-SP |
Os massoretas
orientais estavam localizados na Babilônia, nas regiões de Nahardea, Sura e
Pumbedita (todas no atual Iraque). As escolas rabínicas dessas três cidades
foram importantes na formação do Talmude Babilônico e a tradição massorética
expandiu para além da Babilônia, sendo utilizado em manuscritos produzidos em
outros países orientais como Pérsia, Arábia e Iêmen. Atualmente são conhecidos
120 manuscritos hebraicos de tradição babilônica que pertencem a bibliotecas
universitárias em Cambrigde, Londres, Oxford, Paris, Berlim, Frankfurt, Nova
York e São Petesburgo. Entre os manuscritos mais importantes estão o Códice P
(Kb 13), que contém o texto dos Profetas Posteriores (Isaías, Jeremias,
Ezequeil e o Rolo dos 12 profetas [Oséias a Malaquias]). Muitos manuscritos
babilônicos foram descobertos na Guenizá (depósito) da sinagoga de Ben Ezra do
Cairo em 1890 e que datavam do século IX a XII d.C.
Os massoretas
ocidentais estavam localizados na Palestina e em Tiberíades. Esse grupo esteve
ativo entre os séculos VIII e IX na Palestina, enquanto que em Tiberíades eles
foram ativos entre os séculos IX e X. A tradição palestina tem poucos
manuscritos, enquanto que a tradição de Tiberíades possui muitos manuscritos. O
grupo de Tiberíades tinha como objetivo registrar meticulosamente a pronúncia
do hebraico de maneira mais fiel possível nos fonemas vocálicos. Com isso eles
criaram um sistema detalhado e consistente na pronúncia e recitação do texto da
Bíblia Hebraica. A meticulosa atenção dada ao Alcorão pelo islamismo
influenciou os massoretas, assim como o caraísmo (Seguidores das Escrituras)
que dava ênfase absoluta ao texto da Bíblia Hebraica. Com o passar do tempo à
tradição de Tiberíades passou a ser o padrão para o texto atual da Bíblia
Hebraica em todas as edições impressas por ser considerado o método mais
completo, uniforme, engenhoso, coerente, perfeito, rico em detalhes normativos
de utilização dos sinais vocálicos, tendo a aprovação de vários gramáticos
judeus do período medieval. O grupo de Tiberíades era formado por duas famílias
e os nomes mais importantes desse período foram Moisés ben Asher (com seu filho
Aarão) e Moisés ben Naftali, no final dos séculos IX e X d.C. O texto de Moisés
ben Asher é o texto padrão da Bíblia hebraica atual, conforme melhor
representado pelo Códice Leningrado B19A(L) e o
Códice Alepo.
Fica claro que a
credibilidade do Antigo Testamento Hebraico é indiscutível. Ao comparar as
variações de manuscritos do texto hebraico com as da literatura pré-cristã
(como por exemplo, o Livro dos Mortos do antigo Egito), Archer (1998) afirma
que surpreende o fato de que o texto hebraico não tenha o fenômeno das
discrepâncias e da alteração de manuscritos presentes em literaturas da mesma
época. Segundo Archer (1998), as duas cópias do profeta Isaías achadas na gruta
1 de Qumrã, descobertas em 1947 eram mil anos mais antigas que o manuscrito que
tínhamos até então (980 d.C.). Quando comparadas foi constatado que eram
idênticos, palavra por palavra, à nossa Bíblia Hebraica, em mais de 95% do
texto. As variações, em 5%, consistem nomeadamente de óbvios erros de pena e
variações de ortografia e que não apontam para nenhuma diferença doutrinária,
não afetando a mensagem revelada (1998, p.21,22).
Na arqueologia,
quanto mais antigo o manuscrito, mais próximo dos originais ele está. Os
Manuscritos do Mar Morto, diferente do que muitos imaginavam, apenas endossou a
confiabilidade do texto bíblico do Antigo Testamento. O que aconteceu em 1947
com as descobertas em onze grutas da região do deserto da Judéia dos
manuscritos do Mar Morto (Hirbet Qumran) apenas confirmam a veracidade da
Bíblia. Estes manuscritos incluem textos bíblicos e não bíblicos datados num
período entre a metade do século III a.C. e o início do século II d.C.
As descobertas no
deserto da Judéia deram um grande impulso ao campo da crítica bíblica,
principalmente à crítica textual. Esses manuscritos revelaram vários tipos
textuais da Bíblia Hebraica existentes no período do Segundo Templo. O texto
hebraico que deu origem à Septuaginta, o tipo textual do Pentateuco Samaritano,
assim como o Texto Massorético (TM), estão todos representados no material
encontrado. Outra contribuição fundamental foi a melhor compreensão do processo
de transmissão do texto bíblico. Durante dezoito anos (1947-1965) os
arqueólogos encontraram vários manuscritos de todos os livros da Bíblia
Hebraica, exceto o livro de Ester. Foram encontrados cerca de 900 manuscritos,
dos quais mais de 200 são de textos bíblicos. Vários textos não bíblicos foram
encontrados e que nos ajudam a compreender a teologia e o pensamento do
período. Além desses textos também foram encontrados comentários de livros
bíblicos e traduções aramaicas (os targuns).
Portanto, quando
alguém sugere que o texto do Antigo Testamento foi modificado para atender
certos interesses da religião, diante das evidências fica claro que isso não é
verdade. Se algum texto do Antigo Testamento tivesse sido modificado, os
estudiosos e acadêmicos teriam percebido e revelado isso ao mundo. Sim, podemos
confiar no Antigo Testamento que temos nas Bíblias atuais. Como nos diz o
próprio Deus: “Então o SENHOR me disse: Viste bem, porque estou atento para que
a minha palavra se cumpra” (Jeremias 1:12). Continuamos na próxima semana
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