21 de março de 2014

O Fiel e os Infiéis

Pastor Gilson Souto Maior Jr - Igreja Batista do Estoril - Bauru-SP



Fidelidade... Eis uma palavra mal compreendida em sua extensão e aplicação. Quando citamos essa virtude, em geral, as pessoas a relacionam ao casamento e a atitude que se espera dos cônjuges. Boa parte das pessoas também compreende essa palavra à luz de uma visão econômica, pois o cartão fidelidade da farmácia, de uma determinada loja ou rede de supermercados garante descontos e vantagens.
Entretanto, quando olhamos a Escritura vemos a verdadeira compreensão a ser destacada dessa virtude. Ela tem a ver com o caráter de Deus e de Sua pessoa. O apóstolo Paulo escrevendo aos romanos contrasta a fidelidade de Deus e a inconstância humana: “E então? Se alguns foram infiéis, a infidelidade deles anulará a fidelidade de Deus? De modo nenhum! Seja Deus verdadeiro, e todo homem, mentiroso [...]” (Romanos 3:3,4a). A nossa infidelidade não mudará quem Deus é, pois Ele jamais muda ou deixa de ser quem é. Sua fidelidade é a nossa segurança, pois certamente cumprirá tudo o que disse que irá fazer.
Como servos do Deus Fiel somos chamados a assumir essa postura em nossa vida; o caráter cristão traz a fidelidade de Cristo (Gálatas 5:22). A fidelidade como uma das características do fruto do Espírito significa que o cristão é alguém totalmente confiável e que tem uma palavra digna de confiança. A visão é ainda mais ampla, pois implica numa pessoa em cujo serviço fiel nós podemos confiar. Como disse Barclay: “Descreve o homem com fidelidade inflexível de Jesus Cristo e a total fidedignidade de Deus” (1985, p.105).
Em Apocalipse vemos Jesus elogiar a igreja de Pérgamo: “Sei onde habitas, onde está o trono de Satanás, mas conservas o meu nome e não negaste a minha fé, mesmo nos dias de Antipas, minha fiel testemunha, que foi morto entre vós, onde Satanás habita” (Apocalipse 2:13). A alusão ao trono de Satanás pode ser uma indicação ao culto de Zeus que era realizado num gigantesco altar que ficava a 240 metros acima do nível da cidade. Certamente não era fácil para os cristãos de Pérgamo habitar ali e testemunhar de sua fé. Mas Jesus destaca a coragem daqueles crentes, especialmente a atitude de Antipas.
Nada se sabe ao certo acerca deste personagem. É bem possível que ele era o líder ou pastor da igreja em Pérgamo, sendo um dos mártires das perseguições romanas. Simeão Metafrastes contava uma história lendária de certo Antipas, bispo de Pérgamo, que nos tempos do imperador Domiciano, foi fechado dentro de um boi de bronze aquecido no fogo. Seu corpo foi literalmente cozido. Diz-se que ele terminou sua vida em louvor e oração. Talvez esta história tenha base em fatos autênticos. O que vai chamar a nossa atenção é que Antipas, por causa de sua fidelidade a Cristo, recebeu o mesmo título do Senhor Jesus, “fiel testemunha” (cf. Ap.1:5). Antipas foi a fiel testemunha da Grande Testemunha, e selou seu testemunho com sangue.
A grande questão que fica evidente ao pensarmos na cristandade pós-moderna é a seguinte: Será que hoje os cristãos – ou pelo menos aqueles que assim professam – são capazes de levar a vida cristã nesse nível de fidelidade? Será que estão dispostos de viver e morrer pela verdade do Evangelho de Cristo? Infelizmente a fidelidade de muitos crentes é semelhante à fidelidade partidária de certos políticos em nossa nação. Os políticos são fiéis enquanto a legenda se alinha aos seus interesses pessoais. Mas eles podem ser de esquerda hoje e amanhã de direita e no futuro de centro, pois na verdade suas posições mudam ao sabor do vento e das possibilidades de vantagem.
Muitos crentes também são assim. Hoje são batistas, amanhã se tornam pentecostais e no futuro podem ser neopentecostais. Comprometem-se diante da igreja em serem membros exemplares, mas depois jogam suas palavras no lixo e atribuem a Deus a mudança de igreja ou de visão doutrinária. O que importa não são convicções, mas arrepios e as experiências pessoais. Às vezes – e lamentavelmente isso não é incomum – muitos trocam as convicções pelo sucesso e buscam na religião o trampolim para ascender socialmente.
Fidelidade tem a ver com uma postura semelhante à de Cristo. Assim como Ele foi fiel na Sua missão, somos chamados a seguir Seus passos: “Quem é, pois, o servo fiel e prudente, que o senhor encarregou dos outros servos para lhes dar o alimento no tempo certo? Bem-aventurado o servo a quem seu senhor, quando vier, encontrar agindo assim” (Mateus 24:45,46). Será que Ele encontrará servos fiéis quando vier em glória? Ou encontrará igrejas cheias de meros frequentadores que em nada serão melhores que aqueles que assistem às partidas de futebol num estádio?
Paulo disse aos coríntios: “Fiel é Deus, por quem fostes chamados para a comunhão de seu Filho Jesus Cristo, nosso Senhor” (1Coríntios 1:9). O Fiel nos chama à comunhão de Seu Filho, pois podemos confiar Nele plenamente. É o Senhor que não permitirá que sejamos tentados além de nossa capacidade (1Coríntios 10:13); Ele é verdadeiro em tudo o que faz (2Coríntios 1:19) e cumprirá Sua promessa e obra em nossa vida (1Tessalonicenses 5:24). É Deus quem nos confirma e nos livra do maligno (2Tessalonicenses 3:3), permanecendo sempre fiel, apesar de nossa incredulidade (2Tessalonicenses 3:13).
Será que existe alguma dúvida diante disso tudo? Espero que de hoje em diante a fidelidade seja vista por você como um aspecto de uma vida transformada, da ação miraculosa e graciosa da graça de Deus em nós. Somente Ele pode nos tornar de infiéis em fiéis, à semelhança de Seu Filho.



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